Existia numa cidade
distante, no mais distante dos sertões uma Vila chamada Caribe. Lá, como em
toda vila do sertão, havia um coronel.
Haviam pessoas pobres também, cada uma em sua pequena porção de terra,
produzindo o suficiente para sobreviver e trocando o excedente com o excedente
dos outros. Às vezes o coronel trazia umas coisas da capital e eles trocavam
seus excedentes pelas novidades que o Coronel trazia. O coronel também produzia
o que precisava, mas o excedente dele era grande, então ele vendia para a
capital. Alguns jovens, filhos dos agricultores mais velhos trabalhavam nas
terras do coronel antes de se casarem, para comprarem suas próprias terras.
Um dia, porém, o coronel
decidiu deixar de plantar e usar suas terras para criar gado ao invés de
plantar. Assim, ele poderia abrir um caminho em um novo e mais lucrativo
mercado. Para isso, não deixaria de vender os produtos agrícolas para a
capital. Ele propôs aos agricultores da vila que, ao invés de plantarem de tudo
e criar animais, focassem toda a sua capacidade produtiva em um único produto.
Ele se comprometeria a comprar toda a
produção para abastecer a Vila e vender
o excedente para a capital. Se cada agricultor focasse em um produto, a Vila
teria de tudo e eles poderiam comprar os produtos que precisassem e ainda
investir no aumento da sua produção.
Assim se fez! João
plantava batatas, José plantava cenouras, Raimundo produzia cebolas e assim por
diante. O coronel, que comprava toda a produção da Vila, abriu um supermercado,
o primeiro conhecido naquela região. Todo mundo vendia para o coronel. Todo
mundo comprava do coronel. Inclusive a carne de gado e o leite, que só o
coronel produzia. Com o tempo, a capital cresceu muito. O coronel passou a
vender caro os melhores produtos para os supermercados da capital, vendendo
apenas a sobra para a vila. Os produtos começaram a ficar mais caros e mais
escassos. Como era o único comprador da vila, o coronel era quem determinava os
preços. Assim, em pouco tempo, a vila inteira vendia barato para o Coronel e
compravam caro o que eles mesmos produziam. O coronel implantou uma caderneta,
em que as pessoas podiam comprar para pagar depois. Em pouco tempo, todos
deviam ao coronel mais do que podiam pagar e não podiam mais sequer negociar
seus produtos com outras vilas.
Para um dos agricultores
foi pior. Ele tinha belas filhas, que despertaram o interesse do coronel e seus
filhos. A relação da família com o coronel se tornou insustentável. Foi quando
ele e seus filhos decidiram romper com o Coronel. Se fecharam em sua
propriedade e se armaram. Prometeram nunca mais permitir os abusos econômicos e
o assédio contra seus filhos e filhas. Decidiram cuidar uns dos outros e,
apesar das dificuldades, produzir tudo o que precisassem, sem depender mais de
um coronel canalha. Todos entendiam o porquê da vida difícil que levavam isolados.
Porém, gerações mais tarde, os herdeiros do coronel já falecido, tentando
retomar o controle sobre aquela família, passaram a tentar seduzir as crianças
da família, mostrando do outro lado da cerca brinquedos e doces que eles não
podiam ter acesso por não ter dinheiro nem de quem comprar. A maioria dos
filhos continuou entendendo a condição, mas alguns se revoltaram, alguns até
chegaram a pular a cerca e ir morar com os novos coronéis.
Essa história é baseada em
fatos reais, se passou nos anos 50. A vila é a América Central, o Coronel é o
governo dos Estados Unidos por meio da United Fruit Corporation. O agricultor
que se voltou contra o Coronel, que, com muita dificuldade, mantém seus
“filhos” alimentados e saudáveis desde a Revolução em 1959, é Cuba. Os
americanos, por meio de ditaduras militares, impuseram seus interesses
comerciais e políticos em toda a América Central nos anos 1950. Cuba, por meio
de uma Revolução Popular em 1959, reverteu essa lógica. Isso não fez Cuba
superar a pobreza e a dificuldade de produção fruto da monocultura imposta pelo
Tio Sam. Por isso, teve que desenvolver um sistema próprio de educação,
segurança, transporte e, principalmente, saúde. Nem tudo deu certo e Cuba ainda
tem muitos problemas. Mas a saúde se tornou referência no mundo inteiro. Os
médicos cubanos são profissionais comunitários, especialistas em prevenção de
doenças. Cuba consegue produzir profissionais de medicina numa proporção que
não há nada parecido no mundo.
Isso gerou um excedente
que fez apresentar-se ao mundo as maiores características da Revolução Cubana
de Fidel e Ernesto: a solidariedade, a cooperação e o internacionalismo. Os
revolucionários cubanos viam todo povo pobre do mundo como um só. Sobretudo
Ernesto Guevara, o médico argentino que virou cidadão do mundo e criou o
sistema de saúde cubano, quando Cuba tinha apenas três mil médicos e treze
professores de medicina para dar conta de um país. Hoje Cuba é o país com mais
médicos por habitante no mundo. Eles exportam médicos e recebem dos países que
podem pagar, uma ajuda financeira para manter seu programa que faz bem ao
mundo.
Segundo dados de 2016,
eram mais de 90 mil médicos em 62 países, dos quais 35 pagavam pelo serviço. A
maioria dos países na América Latina e África, além de alguns da Ásia e,
acredite, Rússia e Portugal. Cuba também mantém um curso gratuito para
estrangeiros com mais de 2 mil alunos de diversas nacionalidades. São Hoje mais
400 mil profissionais no Sistema de saúde cubano entre médicos, dentistas e
enfermeiros. Você pode não saber disso tudo, nem tem essa obrigação, mas o
presidente eleito, deputado federal nos últimos 28 anos sabe. Cuba não está
encerrando o Acordo de Cooperação do Brasil porque Bolsonaro está com “pena”
dos cubanos. Eles estão indo embora porque, no Brasil, infelizmente, a
xenofobia, o ódio ideológico, o racismo e o corporativismo dos médicos
brasileiros venceram. Cuba está retirando seus cidadãos daqui para protegê-los,
pois o novo mandatário da nossa nação já demonstrou que os odeia.
O Brasil vai sentir esse
impacto, mais precisamente a população mais pobre. Esta, porém, tem demonstrado
toda a sua gratidão e carinho pelos irmãos latinos que vieram nos ajudar.
Inclusive em Santa Cruz, em que acontecerá no próximo sábado, dia 24/11, na
sede da UESCC (por trás da Escola Padre Zuzinha), às 18h, uma celebração de
gratidão de movimentos sociais e artistas da cidade. Uma festa de despedida à
altura da solidariedade cubana.