A indústria da mentira
sistematizada, da manipulação de notícias com fontes ditas alternativas, das
quais só importa a manchete, somado a um sofisticado método de difusão, foi
fator decisivo nas eleições de 2018. A estratégia, porém, vem de antes e continua
ativa.
Quando Marielle Franco e
Anderson foram assassinados, a internet foi inundada por links que levavam a
uma falsa notícia na qual Marielle seria esposa de um traficante. A comoção
pela morte de Marielle e as cobranças devidas por justiça, que deveriam ser
independentes de qualquer ideologia política, foram substituídos por um
sentimento de revanche e ódio baseado numa notícia falsa.
A mentira foi desfeita,
mas o estrago estava feito. Duas personalidades no nosso país sabem bem o
estrago que pode ser causado pelas notícias falsas caluniosas. Falo de Jean
Willys e Maria do Rosário. Claro que pode-se discordar dos dois, mas a eles foi
atribuída uma série incontável de absurdos, que vão da defesa de estupradores
até legalização da pedofilia. A destruição de reputação é algo sério e
perigoso.
Qualquer coisa relacionada
a Jean Willys e Maria do Rosário é facilmente digerida pelos devoradores de
fakenews. Com a queda de interação nas redes de apoiadores de Bolsonaro,
atestada por especialistas, as notícias falsas voltaram com toda a força. A
queda nas interações se devem às investigações contra Flávio Bolsonaro e o mal
desempenho do governo até aqui, sobretudo o bate cabeças entre os ministros e a
participação vergonhosa do presidente no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na
Suíça.
O cerco da investigação
que apura a contratação de assessores laranjas para o gabinete de Flávio
Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, acabou tendo como
desdobramento a descoberta de ligação do filho mais velho do presidente com
milicianos do RJ. Além das homenagens prestadas a estes durante mandato na
ALERJ, veio à tona a contratação para o gabinete de Flávio da mãe de Adriano
Magalhães da Nóbrega, que teve prisão decretada por suposto envolvimento na
morte de Marielle e está foragido. A mãe de Adriano a fez depósitos na conta de
Fabrício Queiroz, segundo relatório do COAF.
Quanto mais a investigação
se aprofunda, mais perto fica Flávio Bolsonaro da morte de Marielle.
Paralelamente, Jean Willys decidiu deixar o Brasil. O parlamentar vinha
recebendo ameaças de morte e tortura contra ele e sua família - incluindo
ameaças de estupro à sua mãe - e não vai assumir o mandato para o qual foi
eleito. O fato das histórias ocorrerem simultaneamente foi um prato cheio para a
indústria da mentira.
Circula desde que Jean
anunciou sua decisão, vídeos e textos, sobretudo no WhatsApp, com uma teoria de
que o parlamentar estaria saindo do país por causa de um suposto envolvimento
com o atentado sofrido por Jair Bolsonaro na campanha presidencial de 2018.
Claro, sem qualquer conexão com a realidade ou fundamento.
Logo em seguida o alvo foi
Maria do Rosário. Surgiram às centenas links com uma falsa notícia de que a mãe
de Adélio Bispo de Oliveira, que atacou Bolsonaro, seria assessora do gabinete
de Maria do Rosário. Ainda mais recente, outra cortina de fumaça, de que Maria
do Rosário teria postado foto confundindo o ator Sandro Rocha com um miliciano,
incluindo um vídeo do ator afirmando que processaria a parlamentar.
Com uma simples pesquisa
no Google usando as palavra Maria Rosário Tropa de Elite, o direcionamento é a
centenas de links com a história contada pelo ator. A postagem não existe no
Twitter da deputada e, até o momento, nenhum veículo de comunicação com alguma
relevância noticiou o caso.
Está claro que acontece em
nosso país uma guerra de verdades. Mesmo quando o fato é incontestável, surge
um outro assunto, compartilhado por centenas de sites para direcionar para
difusores de fakenews o conteúdo com as mesmas palavras chave que levaria a uma
pauta negativa aos Bolsonaro.
Impressiona a sofisticação
e irresponsabilidade. Pessoas podem perder suas vidas graças ao linchamento
virtual causado pela devastação na reputação de alguém que é vítima de uma
notícia falsa. É imperdoável e deve ser combatido com a seriedade devida, antes
que o estrago seja maior.