terça-feira, 20 de novembro de 2018

A TRISTE PARTIDA

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Existia numa cidade distante, no mais distante dos sertões uma Vila chamada Caribe. Lá, como em toda vila do  sertão, havia um coronel. Haviam pessoas pobres também, cada uma em sua pequena porção de terra, produzindo o suficiente para sobreviver e trocando o excedente com o excedente dos outros. Às vezes o coronel trazia umas coisas da capital e eles trocavam seus excedentes pelas novidades que o Coronel trazia. O coronel também produzia o que precisava, mas o excedente dele era grande, então ele vendia para a capital. Alguns jovens, filhos dos agricultores mais velhos trabalhavam nas terras do coronel antes de se casarem, para comprarem suas próprias terras.

Um dia, porém, o coronel decidiu deixar de plantar e usar suas terras para criar gado ao invés de plantar. Assim, ele poderia abrir um caminho em um novo e mais lucrativo mercado. Para isso, não deixaria de vender os produtos agrícolas para a capital. Ele propôs aos agricultores da vila que, ao invés de plantarem de tudo e criar animais, focassem toda a sua capacidade produtiva em um único produto. Ele se comprometeria  a comprar toda a produção para abastecer a Vila  e vender o excedente para a capital. Se cada agricultor focasse em um produto, a Vila teria de tudo e eles poderiam comprar os produtos que precisassem e ainda investir no aumento da sua produção.

Assim se fez! João plantava batatas, José plantava cenouras, Raimundo produzia cebolas e assim por diante. O coronel, que comprava toda a produção da Vila, abriu um supermercado, o primeiro conhecido naquela região. Todo mundo vendia para o coronel. Todo mundo comprava do coronel. Inclusive a carne de gado e o leite, que só o coronel produzia. Com o tempo, a capital cresceu muito. O coronel passou a vender caro os melhores produtos para os supermercados da capital, vendendo apenas a sobra para a vila. Os produtos começaram a ficar mais caros e mais escassos. Como era o único comprador da vila, o coronel era quem determinava os preços. Assim, em pouco tempo, a vila inteira vendia barato para o Coronel e compravam caro o que eles mesmos produziam. O coronel implantou uma caderneta, em que as pessoas podiam comprar para pagar depois. Em pouco tempo, todos deviam ao coronel mais do que podiam pagar e não podiam mais sequer negociar seus produtos com outras vilas.

Para um dos agricultores foi pior. Ele tinha belas filhas, que despertaram o interesse do coronel e seus filhos. A relação da família com o coronel se tornou insustentável. Foi quando ele e seus filhos decidiram romper com o Coronel. Se fecharam em sua propriedade e se armaram. Prometeram nunca mais permitir os abusos econômicos e o assédio contra seus filhos e filhas. Decidiram cuidar uns dos outros e, apesar das dificuldades, produzir tudo o que precisassem, sem depender mais de um coronel canalha. Todos entendiam o porquê da vida difícil que levavam isolados. Porém, gerações mais tarde, os herdeiros do coronel já falecido, tentando retomar o controle sobre aquela família, passaram a tentar seduzir as crianças da família, mostrando do outro lado da cerca brinquedos e doces que eles não podiam ter acesso por não ter dinheiro nem de quem comprar. A maioria dos filhos continuou entendendo a condição, mas alguns se revoltaram, alguns até chegaram a pular a cerca e ir morar com os novos coronéis.

Essa história é baseada em fatos reais, se passou nos anos 50. A vila é a América Central, o Coronel é o governo dos Estados Unidos por meio da United Fruit Corporation. O agricultor que se voltou contra o Coronel, que, com muita dificuldade, mantém seus “filhos” alimentados e saudáveis desde a Revolução em 1959, é Cuba. Os americanos, por meio de ditaduras militares, impuseram seus interesses comerciais e políticos em toda a América Central nos anos 1950. Cuba, por meio de uma Revolução Popular em 1959, reverteu essa lógica. Isso não fez Cuba superar a pobreza e a dificuldade de produção fruto da monocultura imposta pelo Tio Sam. Por isso, teve que desenvolver um sistema próprio de educação, segurança, transporte e, principalmente, saúde. Nem tudo deu certo e Cuba ainda tem muitos problemas. Mas a saúde se tornou referência no mundo inteiro. Os médicos cubanos são profissionais comunitários, especialistas em prevenção de doenças. Cuba consegue produzir profissionais de medicina numa proporção que não há nada parecido no mundo.

Isso gerou um excedente que fez apresentar-se ao mundo as maiores características da Revolução Cubana de Fidel e Ernesto: a solidariedade, a cooperação e o internacionalismo. Os revolucionários cubanos viam todo povo pobre do mundo como um só. Sobretudo Ernesto Guevara, o médico argentino que virou cidadão do mundo e criou o sistema de saúde cubano, quando Cuba tinha apenas três mil médicos e treze professores de medicina para dar conta de um país. Hoje Cuba é o país com mais médicos por habitante no mundo. Eles exportam médicos e recebem dos países que podem pagar, uma ajuda financeira para manter seu programa que faz bem ao mundo.

Segundo dados de 2016, eram mais de 90 mil médicos em 62 países, dos quais 35 pagavam pelo serviço. A maioria dos países na América Latina e África, além de alguns da Ásia e, acredite, Rússia e Portugal. Cuba também mantém um curso gratuito para estrangeiros com mais de 2 mil alunos de diversas nacionalidades. São Hoje mais 400 mil profissionais no Sistema de saúde cubano entre médicos, dentistas e enfermeiros. Você pode não saber disso tudo, nem tem essa obrigação, mas o presidente eleito, deputado federal nos últimos 28 anos sabe. Cuba não está encerrando o Acordo de Cooperação do Brasil porque Bolsonaro está com “pena” dos cubanos. Eles estão indo embora porque, no Brasil, infelizmente, a xenofobia, o ódio ideológico, o racismo e o corporativismo dos médicos brasileiros venceram. Cuba está retirando seus cidadãos daqui para protegê-los, pois o novo mandatário da nossa nação já demonstrou que os odeia.

O Brasil vai sentir esse impacto, mais precisamente a população mais pobre. Esta, porém, tem demonstrado toda a sua gratidão e carinho pelos irmãos latinos que vieram nos ajudar. Inclusive em Santa Cruz, em que acontecerá no próximo sábado, dia 24/11, na sede da UESCC (por trás da Escola Padre Zuzinha), às 18h, uma celebração de gratidão de movimentos sociais e artistas da cidade. Uma festa de despedida à altura da solidariedade cubana.

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